Crente Boca Suja.

No domingo passado, ao falar sobre o desequilíbrio entre a verdade sem graça (legalismo) e a graça sem verdade (libertinagem), eu mencionei a tendência crescente entre muitos cristãos pós-modernos de soltar o verbo e liberar os palavrões como se fosse a coisa mais natural do mundo. Algumas pessoas me perguntaram se eu não estava caindo novamente no legalismo simplesmente por questionar isso. Vejamos.
Em primeiro lugar é preciso reconhecer que esta é uma questão mais complexa do muitos gostariam que fosse. Já conversei com várias pessoas sobre isso nos últimos anos e tenho a impressão de que muitos pensam que basta citar alguns versículos das Escrituras e assunto encerrado. Mas não é bem assim. O difícil é determinar quando uma palavra é torpe ou obscena uma vez que a linguagem é algo vivo e as palavras e seus significados mudam com o tempo. Algo que era considerado um palavrão nos dias de Jesus ou Paulo pode nem sequer ser utilizado hoje.
Sendo assim temos que lidar com questões sobre contexto, cultura, significado e eu entendo isso, não sou leigo no assunto e não estou tentando desprezar tais considerações.
Por outro lado, será que o valor de nossas palavras deveria ser determinado pelo meio em que vivemos? Se todos à nossa volta estão usando certas palavras, será que isso significa que nós devemos usá-las também?
Algumas pessoas dizem que o uso de palavrão se tornou natural em nossa cultura e que os únicos que ficam ofendidos são os “legalistas religiosos”. Realmente parece que cada vez mais pessoas estão usando palavrão como parte de seu vocabulário. Mas isso não torna o palavrão menos palavrão. De fato, as pessoas usam certas palavras justamente porque elas querem dizer algo para chocar, dar ênfase, ofender, etc. Ou seja, mesmo com o uso cada vez mais corriqueiro, certas palavras continuam sendo torpes e obscenas em nossa cultura.
O comediante americano George Carlin em seu show “Sete palavras que você nunca deve dizer na TV” demonstrou (mesmo que a contragosto) que há certas palavras que são inapropriadas. Bono que o diga. Por usar uma destas palavras na entrega do Globo de Ouro em 2003, ele criou problemas para a rede de TV norte-americana Fox.
Eu gosto da idéia de que se você não usaria uma determinada palavra numa conversa com sua mãe, numa reunião como igreja, numa entrevista de emprego ou para alguém que você acabou de conhecer, então essa palavra parece não ser apropriada para seu uso corriqueiro. Novamente, parece uma idéia simplista (e talvez seja), mas creio que é um começo.
Seria válido falar palavrão para se identificar com as pessoas que estamos tentando alcançar?
Eu me lembro de quando fazia visitas na antiga Casa de Detenção Carandirú em São Paulo. Os presos tinham um código de respeito para com os “crentes” que os visitavam. Não se falava palavrão perto deles. Percebi o mesmo com relação as prostitutas em alguns prostíbulos onde estive com os missionários do Projeto Toque. Quando alguma delas que não nos conhecia começava a baixar o nível das palavras, era logo censurada pelas companheiras. Fico imaginando o que essas pessoas pensariam ao ouvir um discípulo de Cristo falando as mesmas palavras que elas, apesar de usarem, reprovam. Será que elas veriam evidências de uma nova vida no falar deste discípulo?
Como eu disse em minha reflexão, precisamos rever nosso conceito de liberdade cristã. Para muitos, a nova versão de liberdade que eles estão aderindo é apenas uma revisão da velha escravidão que eles pensam ter deixado para trás.
Liberdade cristã não é liberdade para fazer o que quer que eu desejo. Liberdade cristã é liberdade para servir a Cristo e fazer o que Ele deseja. É liberdade para agradar a Deus. É liberdade no Espírito Santo. E o fruto do Espírito é amor, paz, bondade… domínio próprio.
Lutero colocou da seguinte forma em seu clássico texto Da Liberdade Cristã (1520): “Um cristão é senhor livre sobre todas as coisas e não está sujeito a ninguém – pela fé. Um cristão é servidor de todas as coisas e sujeito a todos – pelo amor.”
Quando leio passagens como Efésios 2.1-5 e 4.22, 1 Pedro 4.3, Tito 3.3, dentre outras, há uma indicação clara de que nossa vida antes de Cristo era marcada por certas coisas que já não devem mais persistir uma vez que estamos ligados à Cristo. Os verbos usados – éramos, andávamos, vivíamos – indicam uma condição passada. Mas agora, diz a Bíblia, somos novas criaturas e devemos despir (despojar) a velha condição. Me parece estranho que seguidores de Cristo queiram continuar na condição passada, exibindo os mesmos maus hábitos e caindo nos mesmos erros.
É neste contexto do novo homem que Paulo fala aos Efésios (4.29): “Não saia de vossa boca nenhuma palavra torpe.” (ARA)
O dicionário Houaiss define TORPE como:
que contraria ou fere os bons costumes, a decência, a moral; que revela caráter vil; ignóbil, indecoroso, infame
que contém ou revela obscenidade; indecente
que causa repulsa; asqueroso, nojento
que apresenta mácula; sujo
Ou seja, mesmo considerando as mudanças do vocabulário com o decorrer dos tempos, uma palavra torpe hoje continua sendo torpe.
Algumas pessoas argumentam que xingar é ser transparente e honesto. Todavia, o próprio bom senso nos diz que não devemos ser transparentes em tudo exatamente. Ainda que não exista nada em nossa vida que esteja oculto aos olhos de Deus – não há áreas privadas diante de Deus – há todavia, áreas e coisas que fazemos que não deveriam se tornar públicas. Por exemplo, o exercício de nossas necessidades físicas. Ninguém que tenha um bom senso ira advogar que, em nome da transparência, deve-se abaixar as calças em público e se aliviar na frente de todos. Isso seria indecoroso na maioria das culturas e sociedades do nosso mundo hoje. Ou seja, a tal de transparência neste caso me parece mais uma desculpa para obscenidade do que algo sincero.
Todd Hunter, presidente do Curso Alpha certa vez disse: “Como um discípulo de Jesus usa sua linguagem? O amor deve ser o árbitro de todo o falar.”
Quando você manda alguém ir se f**** ou chama uma pessoa de filho da p***, você está demonstrando amor? Você consegue ver a atitude de Cristo nisso? Imagino que não. Não importa o quão transparente você diga que está sendo, a única coisa que sua atitude transparente está demonstrando é a ira e falta de domínio próprio.
Então ouço pessoas apontando outros pecados, dizendo que alguém não xinga, mas odeia de qualquer maneira. Ora, um pecado não justifica o outro. Deus nos chamou para uma nova vida, com novas atitudes e novos hábitos.
Creio que xingar é um mal hábito e como todo mal hábito deve ser desencorajado, procurando livrar-se dele em busca de novos hábitos. Gosto do Bono como artista. Lendo uma de suas entrevistas certa vez, achei curioso que ele mesmo considera o falar palavrão como um mal hábito que ele possui. Mesmo gostando de sua arte, não significa que eu deva gostar ou adquirir seus maus hábitos.
Jesus elevou os padrões para os seus seguidores, em vez de diminuí-los como muitos aderentes da graça barata parecem pensar que Ele tenha feito. Tiago nos chama para um viver comprometido com os pobres e oprimidos ao mesmo tempo em que nos mantemos incontaminados com o mundo – inclusive no falar (1.26-27). Uma simples leitura a carta de Tiago revela que ele tinha muito a dizer sobre o Cristianismo prático e o uso da língua.
Por tudo isso e mais um pouco, creio que os seguidores de Cristo devem evitar ao máximo o uso de linguagem torpe/obscena, especialmente em público.
Que Deus nos ajude a viver não no legalismo nem na libertinagem, mas na verdadeira liberdade no Espírito.
********
Arte: Svetlana Nikulina
Conheça o original aqui.

7 comentários em “Crente Boca Suja.”

  1. Graça e paz, Pr.Carlos!
    “Andando” por aí cheguei até o seu Blog e quero te parabenizar pela bênção que pude ver aqui.
    Realmente isso tem acontecido de forma desenfreada e o cristão precisa mesmo ser alertado.
    A pretxto de "liberdade" muitos querem escancarar demais…pra mim não passa de marketing, coisa que eles mesmos dizem odiar tanto(será???)
    Já estou te seguindo e aos poucos venho conhecer mais os seus textos.
    Será uma honra te receber no pastoragente.blogspot.com, e se quiser segui-lo vai ser uma alegria pra mim.
    No blog conto da forma mais realista e divertida possível as realidades, dúvidas e experiências de uma simples pastora como eu.
    Fique na paz. Um abraço.

  2. Pastoragente muito obrigado pelo comentário e vou adicionar um "seguidores" aqui. Na verdade tenho um este site entre os dois blogs que administro (www.igrejaurbana.org) e as vezes toma muito tempo, fique a vontade para entrar e comentar.
    Carlos Rizzon

  3. Olá Cintia com certeza parece sim. Parece que estamos ultrapassados e vivendo um pesadelo e que o Senhor nos guarde nestes tempos e que não percamos o amor, a fé e a esperânça.

    Pr. Carlos Rizzon

  4. TRANSPARÊNCIA
    Quem nada esconde

    “Disse mais o rei Davi a toda a congregação: Salomão, meu filho, o único a quem Deus escolheu, é ainda moço e inexperiente, e esta obra é grande; porque o palácio não é para homens, mas para o Senhor Deus” – I Crônicas 29.1.
    A transparência é a virtude que impede a ocultação de alguma vantagem pessoal, a ocultação de alguma fraqueza pessoal ou a ocultação de alguma miséria pessoal. Por meio da transparência, a pessoa é o que é, nem melhor e nem pior! A transparência revela tanto o que a pessoa é como o que a pessoa tem! A verdadeira transparência não exagera, não inventa vantagens e nem desvantagens! É um dos mais válidos recursos de prevenção contra o pecado. Sabe por quê? Porque a transparência obriga a pessoa a se conhecer e a tomar os devidos cuidados. Como cristãos, servos a serviço do Rei da Glória, os crentes em Jesus Cristo deveriam, pela natureza da opção que fizeram, serem exemplos vivos de transparência em todos os aspectos da vida. A falta de transparência na vida do cristão é revelada em pecados, sejam eles manifestos em pequenos ou grandes atos, em ações ou atitudes, pecado é pecado independente de seu tamanho ou de sua proporção.
    Às vezes, fico me perguntando por que é tão difícil ser transparente? Costumamos acreditar que ser transparente é simplesmente ser sincero, não enganar os outros. Mas ser transparente é muito mais do que isso. É ter coragem de se expor, de ser frágil, de chorar, de falar do que a gente sente… Ser transparente é desnudar a alma, é deixar cair as máscaras, baixar as armas, destruir os imensos e grossos muros que nos empenhamos tanto para levantar…
    Você pode estar dizendo: “Mas eu sou transparente…”. Sim, mas em que grau? Qual a escala em que seus atos podem ser expostos? Vejamos. No seu trabalho você nunca se beneficiou de nada que contrariasse as normas da empresa? Com sua esposa, você nunca escondeu algo, mesmo que seja mínimo? Ela realmente é informada de tudo? E com seus filhos, eles o conhecem por inteiro? Você nunca tirou vantagens de situações ou de suas funções na sua vida secular? No cumprimento das leis, especialmente as de trânsito, você é exemplar? Ou será que ultrapassar em faixa continua não é crime? Quem sabe andar além da velocidade permitida não o incomoda? Você é 100% transparente, ou isto não importa? Eu, eu apenas estaciono em local proibido só nas eventualidades… Fila, eu nunca furei… Eu poderia citar outras situações, mas deixo com você a tarefa de examinar-se e avaliar até onde, na sua conduta, algo que impeça a transparência total de sua vida como servo de Deus.
    A fraqueza do homem o faz vacilar, o sentimento de estar fazendo algo sem que seja descoberto ou que aos seus olhos não pareça errado o leva a agir adônicamente, transformando o erro em algo natural, muitas vezes convertendo suas práticas em rotina na sua jornada. Confessamos Jesus como Senhor de nossas vidas, mas agimos segundo o instinto do velho homem, certos até de que estamos protegidos da impunidade, que nada nos acontecerá mesmo que as nossas ações nos condenem. Cantamos que “JESUS CRISTO MUDOU NOSSO VIVER”, mas caminhamos exatamente no sentido oposto, contrariando tudo que recomendam as Escrituras, com toda a naturalidade.
    Muitos crentes estão revestidos pelo “INSUFILM” – tecido de policarbonato usado sobre a superfície de vidros automotivos ou arquitetônicos com a finalidade de escurecê-los ou de mudar suas propriedades de transparência ou de cor – do pecado, assim, vivem uma vida espelhada numa realidade falsa, escondendo atos e atitudes que contrariam os princípios elementares da fé cristã. É a transparência restrita, condicionada a interesses muitas vezes duvidosos, onde nem tudo pode, pelas suas características, ser desnudado, isto é, mostrado.
    Já no fim de seu reinado Davi foi transparente em seu discurso de despedida! Ele assumiu em público, não escondeu de Israel a imaturidade de seu sucessor, mesmo sendo o seu filho. Isto é uma notável transparência! Davi confidenciou à nação: “Pôs-se o rei Davi em pé e disse: Ouvi-me, irmãos meus e povo meu: Era meu propósito de coração edificar uma casa de repouso para a Arca da Aliança do Senhor e para o estrado dos pés do nosso Deus, e eu tinha feito o preparo para a edificar. Porém Deus me disse: Não edificarás casa ao meu nome, porque és homem de guerra e derramaste muito sangue” – I Crônicas 28.2 e 3. Uma das maiores frustrações de Davi foi não ter construído o Templo de Jerusalém! Foi ele quem teve a idéia, foi ele quem escolheu e comprou o terreno, foi ele quem mandou elaborar o projeto, foi ele quem ajuntou o material de construção, foi ele quem ofertou grande quantidade do mais puro ouro e de prata pura e ainda pediu o apoio e a colaboração do povo. Porém, não teve a satisfação de levantar o templo porque, ele mesmo conta, exagerou nas guerras e nas matanças! Davi poderia ter escondido isso do povo, mas não o fez! Aqui está um impressionante exemplo de transparência!
    Se Davi sendo rei, sendo o “HOMEM SEGUNDO O CORAÇÃO DE DEUS”, se mostrou ser igual a nós, seria muito bom se nos mostrássemos iguais a ele nessa questão de transparência! Assim estaríamos livres de qualquer “RESÍDUO DE HIPOCRISIA”, o pecado que Jesus menos tolerava! Davi, o “HOMEM SEGUNDO O CORAÇÃO DE DEUS”, se mostra igual a mim e igual a você! Em seus Salmos isso é evidente mais ainda: “Por causa do teu nome, Senhor, perdoa a minha iniqüidade, que é grande” – Salmos 25.11. “Volta-te para mim e tem compaixão, porque estou sozinho e aflito. Alivia-me as tribulações do coração; Tira-me das minhas angústias. Considera as minhas aflições e o meu sofrimento” – Salmos 25.16 e 18. “Eu sou pobre e necessitado, porém o Senhor cuida de mim; Tu és o meu amparo e o meu libertador; Não te detenhas, ó Deus meu!” – Salmos 40.17. “Pois eu conheço as minhas transgressões, e o meu pecado está sempre diante de mim” – Salmos 51.3. Davi confessava com freqüência as suas deficiências e as suas dificuldades em lidar com as lutas da vida e de sua responsabilidade em expressar, com atos, ações e atitudes, o domínio de Deus sobre a sua vida. Ele, que era um “HOMEM SEGUNDO O CORAÇÃO DE DEUS”, tinha o dever de expressar isto de todas as formas possíveis e até nas impossíveis.
    Lamentavelmente o que mais falta nos crentes hoje é exatamente a TRANSPARÊNCIA, a maioria sequer se preocupa em colocar em xeque a conduta diante de certas circunstâncias, o que vale é tirar proveito ou melhor, levar vantagem seja de que forma for, usando o famoso jeitinho como pano de fundo.
    Você é transparente em 100% nas suas práticas religiosas? Não precisa responder, não quero causar constrangimento ou seduzi-lo a mentir apenas para me agradar, quero apenas sinceridade na sua conduta, se proceder assim, creio que já teremos um avanço enorme no exercício da fé cristã. A transparência gera equilíbrio e respeito, ela também possui uma intimidade inseparável com a verdade que é a base da vida cristã.
    Você quer se libertar de toda a hipocrisia que existe em você? Você quer viver uma vida na verdade, sendo transparente em tudo? Você tem coragem de expor suas fraquezas, suas misérias e seus atos ocultos? Deus quer ver a transparência em seu coração, mostre-se a Ele! E Jesus em nosso coração realiza esta transformação. Assuma consigo mesmo este desafio, lute, mas lute com lealdade aos seus princípios e com certeza você será 100% transparente diante dos homens, mas principalmente diante de Deus.

    Carlos Roberto Martins de Souza
    crms2casa@hotmail.com

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *